quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Restos mortais de Cristóvão Colombo

A 19 de Janeiro de 1899 chegam a Sevilha os supostos restos mortais de Cristóvão Colombo, transportados pelo trem Giralda.


Os alegados restos mortais de Cristóvão Colombo
O túmulo de Colombo faz parte de uma história intrigante.
Morto em 1506, foi sepultado em Valladolid, na Espanha. Em 1537, os espanhóis transferiram os restos mortais para a ilha Hispaniola, hoje dividida entre o Haiti e a República Dominicana. Quase duzentos anos depois, quando a Espanha perdeu parte desse território para a França, o corpo foi levado para Cuba. Sendo então, em 1899, transferido para Sevilha.

Percurso complexo, não? Para piorar, há um pequeno problema no enredo. A República Dominicana afirma que o corpo nunca deixou o país. No entanto, um teste de DNA determinou que os restos mortais em Sevilha pertencem realmente a Colombo. A República Dominicana reagiu, mostrando outros restos mortais. Mas esses nunca foram testados, o que nos leva a crer que a verdade repousa em Sevilha.
Mas afinal quem foi Cristóvão de Colombo?
Nascido em Génova, entre 22 de Agosto e 31 de Outubro de 1451 vem a morrer em Valladolid, 20 de Maio de 1506. Navegador e explorador, responsável por liderar a frota que alcançou o continente americano em 12 de Outubro de 1492, sob as ordens dos Reis Católicos de Espanha, no chamado descobrimento da América. Empreendeu a sua viagem através do Oceano Atlântico com o objectivo de atingir a Índia, tendo na realidade descoberto as ilhas das Caraíbas (Antilhas) e, mais tarde, a costa do Golfo do México na América Central.
O seu nome em italiano é Cristoforo Colombo, em latim Christophorus Columbus e em espanhol, Cristóbal Colón. Este antropónimo inspirou o nome de, pelo menos, um país, Colômbia e duas regiões da América do Norte: a Colúmbia Britânica no Canadá e o Distrito de Colúmbia nos Estados Unidos. Entretanto o Papa Alexandre VI escrevendo em latim sempre chamou ao navegador pelo nome de Christophorum Colon com significado de Membro e nunca pelo latim Columbus com significado de Pombo.

Embora Colombo tenha sempre apresentado a conversão dos não-cristãos como um dos motivos das suas expedições, a sua religiosidade aumentou nos últimos anos de vida. Provavelmente com o apoio do seu filho Diogo e do seu amigo, o monge cartuxo Gaspar Gorricio. Colombo produziu dois livros nos seus últimos anos: o Livro de Privilégios (1502), detalhando e documentando as mercês que havia recebido da Coroa Espanhola, às quais acreditava ele e seus herdeiros terem direito, e um Livro de Profecias (1505), no qual usou passagens da Bíblia para colocar os seus feitos como explorador no contexto da escatologia cristã.
No final da vida, Colombo exigiu que a Coroa Espanhola lhe desse 10% de todos os proveitos obtidos nos territórios descobertos, tal como estipulado nas capitulações de Santa Fé. No entanto, uma vez que Colombo havia sido dispensado das suas obrigações como governador, a Coroa não se sentiu obrigada por esse contrato, e as suas exigências foram rejeitadas. Após a sua morte, os herdeiros de Colombo processaram a Coroa com vista a obter uma parte dos proveitos do comércio com as Américas, assim como outros benefícios. Isto levou a uma longa série de disputas legais conhecidas como pleitos colombinos.

Chegada de Colombo a Hispaniola (Actual Ilha de São Domingos)
Colombo morreu em Valhadolid a 20 de Maio de 1506, com cerca de 55 anos, com uma considerável riqueza proveniente do ouro que os seus homens haviam acumulado em Hispaniola. À data da sua morte, Colombo estava ainda convencido que as suas expedições tinham sido realizadas ao longo da costa oriental da Ásia. De acordo com um estudo publicado em Fevereiro de 2007, realizado por António Rodriguez Cuartero, do Departamento de Medicina Interna da Universidade de Granada, Colombo morreu de paragem cardíaca causada por artrite reactiva. Segundo os seus diários pessoais e anotações deixadas pelos seus contemporâneos, os sintomas desta doença (ardor doloroso quando se urina, dor e inchamento das pernas, e conjuntivite) eram claramente evidentes nos três últimos anos da sua vida.
Os restos mortais de Colombo foram inicialmente sepultados em Valladolid, sendo depois transladados para o Mosteiro da Cartuxa em Sevilha. Em 1542, por desejo expresso pelo seu filho Diogo, que fora governador de Hispaniola, os restos mortais foram transferidos para Santo Domingo, na actual República Dominicana, onde foram depositados na catedral da cidade. Em 1795, quando a França obteve o controlo de toda a ilha de Hispaniola, os restos mortais de Colombo foram transladados para Havana, Cuba, e após a independência cubana, na sequência da Guerra Hispano-Americana de 1898, novamente transferidos para Espanha, para a Catedral de Sevilha, onde se encontram sobre um sumptuoso catafalco.
No entanto, em 1877, uma caixa de chumbo com a inscrição "Ilustre y esclarecido varón Don Cristóbal Colón" e contendo fragmentos de osso e uma bala, foi descoberta na Catedral de Santo Domingo. De modo a pôr fim às alegações de as relíquias erradas haviam sido transferidas para Havana e que os restos mortais de Colombo haviam sido deixados enterrados na Catedral de Santo Domingo, em Junho de 2003 foram recolhidas amostras de ADN dos restos mortais que se encontram em Sevilha, assim como outras amostras de ADN dos restos mortais dos seus filhos Diogo e Fernando. As observações iniciais sugeriram que os ossos não aparentavam pertencer a alguém com o físico e idade associados a Colombo. A extracção de ADN revelou-se difícil; apenas pequenos fragmentos de ADN mitocondrial (ADNmt) puderam ser isolados. Estes fragmentos encontraram uma correspondência exacta com o ADNmt do seu irmão Diogo, sustentando a tese de que ambos terão partilhado a mesma mãe. Tal evidência, juntamente com a análise histórica e antropológica, levou os investigadores a concluir que os restos mortais que se encontram em Sevilha pertencem a Cristóvão Colombo. As autoridades de Santo Domingo nunca permitiram que os restos mortais que aí se encontram fossem exumados, de modo que desconhece-se se algum deles pertence também ao corpo de Colombo. Estas relíquias encontram-se actualmente no "Farol de Colombo" (Faro a Colón), em Santo Domingo.


quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Leão II – Imperador Bizantino (Romano do Oriente) 18 de Janeiro de 474

Leão II (Flavius Leo Iunior Augustus, em latim; nasceu em 467 – e morreu a 17 de Novembro de 474. Foi Imperador Romano do Oriente apenas durante 10 meses, de 18 de Janeiro até sua morte, em 17 de Novembro de 474.

Filho de Zenão I e Ariadne (filha de Leão I, o Trácio e Élia Verina). Leão II havia sido nomeado sucessor de Leão I, o Trácio por ser o varão mais próximo do imperador. Subiu ao trono quando morreu seu avô, sendo todavia um menino de apenas sete anos de idade. Seu pai a
tuou como regente durante seu curto reinado.
Governando apenas durante 10 meses, Leão II morreu de uma enfermidade desconhecida sucedeu-lhe seu pai, Zenão I.

O seu curto reinado, interrompido pela sua prematura morte, não apresentando nada de relevante permite-nos apresentar o Império Bizantino e o que ele representou para a construção das sociedades seguintes.
O Império Bizantino foi a continuação do Império Romano durante a Antiguidade Tardia e Idade Média (395-1453). Com a sua capital em Constantinopla (actual Istambul), originalmente conhecida como Bizâncio.

Inicialmente fazendo parte oriental do Império Romano (frequentemente chamado de Império Romano do Oriente), sobreviveu à fragmentação e ao colapso do Império Romano do Ocidente no século V e continuou a prosperar, existindo por mais de mil anos até à sua queda perante a expansão dos turcos otomanos em 1453.
Como a distinção entre o Império Romano e o Império Bizantino é em grande parte uma convenção moderna, não é possível atribuir uma data segura para a separação. Vários eventos do século IV ao século VI marcaram o período de transição durante o qual as metades orientais e ocidentais do Império Romano se dividiram. Em 285, o imperador Diocleciano (r. 284 – 305) dividiu a administração imperial em duas metades.

Entre 324 e 330, Constantino (r. 306 – 337) transferiu a capital principal de Roma para Bizâncio, conhecida mais tarde como Constantinopla ("Cidade de Constantino") e Nova Roma. Sob Teodósio I (r. 379–395), o cristianismo tornou-se a religião oficial do império e, com a sua morte, o Estado romano dividiu-se definitivamente em duas metades, cada qual controlada por um de seus filhos. Finalmente, sob o reinado de Heráclio (r. 610 – 641), a administração e as forças armadas do império foram reestruturadas e o grego foi adotado em lugar do latim. Em suma, Bizâncio distinguiu-se da Roma Antiga na medida em que a sua cultura passou a privilegiar a grega em vez da latina e caracterizou-se pelo cristianismo ortodoxo em lugar do politeísmo romano.
As fronteiras do império mudaram muito ao longo de sua existência, que passou por vários ciclos de declínio e recuperação. Durante o reinado de Justiniano (r. 527 – 565), alcançou a sua maior extensão após reconquistar muito dos territórios mediterrâneos antes pertencentes à porção ocidental do Império Romano, incluindo o norte da África, península Itálica e parte da península Ibérica. Durante o reinado de Maurício (r. 582 – 602), as fronteiras orientais foram expandidas e o norte estabilizado. Contudo, o seu assassinato causou um conflito de duas décadas com o Império Sassânida que delapidou os recursos do império e contribuiu para as suas grandes perdas territoriais durante as invasões muçulmanas do século VII. Durante a dinastia macedônica (século X–XI), o império expandiu-se novamente e viveu um renascimento de dois séculos, que chegou ao fim com a perda de grande parte da Ásia Menor para os turcos seljúcidas após a derrota na batalha de Manziquerta (1071).

No século XII, durante a Restauração Comnena, o império recuperou parte do território perdido e restabeleceu a sua dominância. No entanto, após a morte de Andrônico I Comneno (r. 1183 – 1185) e o fim da dinastia comnena no final do século XII, o império entrou em declínio novamente. Recebeu um golpe fatal em 1204, no contexto da Quarta Cruzada, quando foi dissolvido e dividido em reinos latinos e gregos concorrentes. Apesar de Constantinopla ter sido reconquistada e o império restabelecido em 1261, sob os imperadores paleólogos, o império teve que enfrentar diversos estados vizinhos rivais por mais 200 anos para sobreviver. Paradoxalmente, este período foi o mais produtivo culturalmente de sua história. Sucessivas guerras civis no século XIV minaram ainda mais a força do já enfraquecido império e mais territórios foram perdidos nas guerras bizantino-otomanas, que culminaram na Queda de Constantinopla e na conquista dos territórios remanescentes pelo Império Otomano no século XV.





terça-feira, 17 de janeiro de 2017

17 de Janeiro de 395 – Separação do Império Romano

Teodósio I, dito o Grande (nascido Flávio Teodósio, em Coca, Hispânia, a 11 de Janeiro de 347 d.C. morreu em Milão a 17 de Janeiro de 395 d.C.). Foi imperador romano desde 379 d.C. até à sua morte. Promovido à dignidade imperial após o Desastre de Adrianopolis, primeiro compartilhou o poder com Graciano e Valentiniano II. Em 392 d.C., Teodósio reuniu as porções oriental e ocidental do império, sendo o último imperador a governar todo o mundo romano. Após a sua morte, as duas partes do Império Romano separaram-se, definitivamente, em Império Romano do Oriente e Império Romano do Ocidente.
No que diz respeito à política religiosa, tomou a transcendental decisão de fazer do cristianismo niceno ou catolicismo a religião oficial do Império mediante o Édito de Tessalónica[i] de 380 d.C.

O Império Romano foi o período pós-republicano da antiga civilização romana, caracterizado por uma forma de governo autocrática liderada por um imperador e por extensas possessões territoriais em volta do mar Mediterrâneo na Europa, África e Ásia.
A república que o antecedeu ao longo de cinco séculos encontrava-se numa situação de elevada instabilidade, na sequência de diversas guerras civis e conflitos políticos, durante os quais Júlio César foi nomeado ditador perpétuo e assassinado em 44 a.C. As guerras civis culminaram na vitória de Otávio, filho adotivo de César, sobre Marco António e Cleópatra na batalha de Áccio em 31 a.C. Detentor de uma autoridade inquestionável, em 27 a.C. o senado romano atribuiu a Otávio poderes absolutos e o novo título Augusto[ii], assinalando desta forma o fim da república.

O período imperial prolongou-se por cerca de 500 anos. Os primeiros dois séculos foram marcados por um período de prosperidade e estabilidade política sem precedentes denominado Pax Romana. Na sequência da vitória de Augusto e da posterior anexação do Egito, a dimensão do império aumentou consideravelmente. Após o assassinato de Calígula em 41 d.C., o senado considerou restaurar a república, o que levou a guarda pretoriana a proclamar Cláudio imperador. Durante este período, assistiu-se ao maior alargamento do império desde a época de Augusto. Após o suicídio de Nero em 68, teve início um breve período de guerra civil, durante o qual foram proclamados imperadores quatro generais. Em 69, Vespasiano triunfou sobre os restantes, estabelecendo a dinastia flaviana. O seu filho, Tito, inaugurou o Coliseu de Roma, pouco após a erupção do Vesúvio. Após o assassinato de Domiciano, o senado nomeou o primeiro dos cinco bons imperadores, período durante o qual o império atingiu o seu apogeu territorial no reinado de Trajano.
O assassinato de Cómodo em 192 desencadeou um período de conflito e declínio denominado ano dos cinco imperadores, do qual Septímio Severo saiu triunfante. O assassinato de Alexandre Severo, em 235, levou à crise do terceiro século, durante a qual o senado proclamou 26 imperadores ao longo de cinquenta anos. A imposição de uma Tetrarquia proporcionou um breve período de estabilidade, embora no final tenha desencadeado uma guerra civil que só terminou com o triunfo de Constantino em relação aos rivais. Agora único governante do império, Constantino mudou a capital para Bizâncio, rebatizada Constantinopla em sua honra, a qual permaneceu capital do oriente até 1453. Constantino também adotou o cristianismo, que mais tarde se tornaria a religião oficial do império. A seguir à morte de Teodósio, o domínio imperial entrou em declínio como consequência de abusos de poder, guerras civis, migrações e invasões bárbaras, reformas militares e depressão económica. A deposição de Rómulo Augusto por Odoacro é o evento geralmente aceite para assinalar o fim do império ocidental[iii]. No entanto, o Império Romano do Oriente prolongou-se por mais um milénio, tendo sido conquistado pelo Império Otomano em 1453.

O Império Romano foi uma das mais fortes potências económicas, políticas e militares do seu tempo. Foi o maior império da antiguidade Clássica e um dos maiores da História. No apogeu da sua extensão territorial exercia autoridade sobre mais de cinco milhões de quilómetros quadrados e uma população de mais de 70 milhões de pessoas, à época 21% da população mundial. A longevidade e extensão do império proporcionaram uma vasta influência na língua, cultura, religião, técnicas, arquitetura, filosofia, lei e formas de governo dos estados que lhe sucederam. Ao longo da Idade Média foram feitas diversas tentativas de estabelecer sucessores do Império Romano, entre as quais o Império Latino e o Sacro Império Romano-Germânico. A expansão colonial europeia, entre os séculos XV e XX, difundiu a cultura romana a uma escala mundial, desempenhando um papel significativo na construção do mundo contemporâneo.


[i] O Édito de Tessalônica, também conhecido como Cunctos Populos ou De Fide Catolica foi decretado pelo imperador romano Teodósio I a 27 de fevereiro de 380 d.C. pelo qual estabeleceu que o cristianismo tornar-se-ia, exclusivamente, a religião de estado, no Império Romano, abolindo todas as práticas politeístas dentro do império e fechando templos pagãos.

[ii] Augusto (Augustus, plural: augusti, Latim para "majestoso," "o exaltado," ou "venerável") foi um título antigo romano dado tanto como nome e título para Caio Otávio (frequentemente referido simplesmente como Augusto), o primeiro imperador de Roma. Com sua morte, tornou-se um título oficial de seu sucessor, e foi também usado por imperadores romanos daí em diante

[iii] O Império Romano do Ocidente sofreu invasão dos povos bárbaros, já enfraquecido internamente, caiu em 476 com a deposição do imperador Rômulo Augusto. Outros reis estabeleceram-se em Roma, embora não mais usassem o título de "imperador romano".
O Império Oriental, com capital em Constantinopla, continuou a existir por quase mil anos, até 1453.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Ultimato britânico de 1890


Ultimato britânico de 1890: a 11 de Janeiro de 1890 os ingleses intimam Portugal a retirar as suas tropas do território compreendido entre Moçambique e Angola incluídos no conhecido Mapa cor-de-rosa.
O Ultimatum de 11 de Janeiro de 1890 constituiu um dos pontos-chave para a compreensão do processo de desagregação da monarquia e de afirmação do ideal republicano. Este marcou ainda o choque do projecto colonial de Portugal com os intrincados jogos de interesse colonial entre as três potências europeias da época: Grã-Bretanha, Alemanha e França.

O panorama internacional estava a mudar rapidamente na era que antecedeu o Ultimatum. Verificava-se uma mudança crescente no balanço dos equilíbrios de forças no continente Europeu, com a Alemanha a surgir bem delineada, após a guerra franco-prussiana, face às restantes potências europeias. Tal situação veio a provar-se ser um facto extremamente importante para Portugal, pois pela primeira vez teve uma alternativa à aliança tradicional inglesa. Apesar disso, a Inglaterra manteve um papel dominante, simplesmente já não era a “única” potência europeia no panorama internacional. Ainda assim, com os desenvolvimentos marítimos e económicos surge uma corrida das potências europeias pelo avanço colonial de África, o que cria um jogo sobre o seu equilíbrio neste continente.
Mapa Cor de Rosa. Conferência de Berlim
O Tratado de Berlim[i] marcou influência na política externa portuguesa, uma vez que a partilha de África impôs a Portugal a demarcação de esferas de influência no interior do continente africano. Também a rejeição do princípio dos direitos históricos e a consagração internacional do novo princípio da ocupação efectiva como Direito Internacional para regulação das questões coloniais, obrigou Portugal a ocupar, efectivamente, os territórios que reclamava por direito histórico. Com estas mudanças Portugal viu os seus planos em perigo, pois o projecto inglês de ligação do Cairo à cidade do Cabo colidia com o projecto português denominado “África Meridional Portuguesa”, tendo este consistido, assim, no motivo da problemática em torno do Ultimatum.

O Ultimato britânico de 1890 foi um ultimato do governo britânico, entregue a 11 de Janeiro de 1890 por um “Memorando” a Portugal, para a retirada das forças militares existentes no território compreendido entre as colónias de Moçambique e Angola, no actual Zimbabwe, a pretexto de um incidente ocorrido entre portugueses e Macololos. A zona era reclamada por Portugal, que a havia incluído no famoso Mapa cor-de-rosa, reclamando, assim, a partir da Conferência de Berlim, uma faixa de território que ia de Angola à contra-costa, ou seja, a Moçambique.
 Portugal, perante a pressão diplomática por parte de Inglaterra no sentido de abandonar o projecto, tenta conseguir algum tempo, ao invocar o art.º12[ii] da acta final do Tratado de Berlim levando assim a questão para o fórum internacional e procurando algum apoio da potência emergente europeia, a Alemanha, para mediar o problema. Infelizmente para Portugal a Alemanha estava condicionada pelo acordo que tinha com a Inglaterra, no intuito de não competirem no continente africano.

 A concessão de Portugal às exigências britânicas foi vista como uma humilhação nacional pelos republicanos portugueses, que acusaram o governo e o rei Dom Carlos I de serem os seus responsáveis. Com isto, assistiu-se a uma mudança na política interna portuguesa marcada pela insatisfação social. Com o surgir de um movimento de descontentamento social, os republicanos capitalizam tal descontentamento, iniciando, assim, um crescimento e alargamento da sua base social de apoio que levará à implantação da república a 5 de Outubro de 1910.
Alimentando esse ambiente de quase insurreição, a 23 de Março, António José de Almeida, futuro presidente da república, publica um artigo que foi considerado calunioso para o rei e o levou à prisão. No entanto, a cedência portuguesa foi formalizada a 20 de Agosto com o Tratado de Londres entre Portugal e a Grã-Bretanha, definindo os limites territoriais de Angola e Moçambique.

Em consequência da cedência aos interesses britânicos, apareceu em Lisboa a Liga Liberal, movimento de protesto presidido por Augusto Fuschini com a participação de João Crisóstomo contra o Tratado de Londres. A Liga promoveu uma reunião, no Teatro de São Luís, onde participaram cerca de 400 oficiais fardados.
Após 28 dias de crise política é nomeado, a 14 de Outubro, um governo extra-partidário, presidido por João Crisóstomo. O governo é apoiado pela Liga Liberal, retomando-se progressivamente a calma. Estes acontecimentos desencadeados pelo ultimato britânico, de 11 de Janeiro de 1890, marcaram de forma permanente a evolução política portuguesa, desencadeando uma cadeia de acontecimentos que termina com o fim da monarquia constitucional e com o reforço na consciência colectiva portuguesa do apego ao império colonial, que depois teve constantes consequências ao longo do século XX tanto na política interna como externa de Portugal. 




[i] Conferência de Berlim foi realizada entre 15 de Novembro de 1884 e 26 de Fevereiro de 1885 e teve como objetivo organizar, por meio de regras, a ocupação da África pelas potências coloniais, resultando numa divisão territorial que não respeitou, nem a história, nem as relações étnicas e mesmo familiares dos povos desse continente. O seu organizador e acompanhante foi Chanceler Otto von Bismarck da Alemanha e participaram a Grã-Bretanha, França, Espanha, Portugal, Itália, Bélgica, Holanda, Dinamarca, Estados Unidos, Suécia, Áustria-Hungria e Império Otomano.

[ii] Artigo 12. Caso um desentendimento sério, nascido do assunto ou dos limites dos territórios mencionados no artigo 1 e colocados sob o regime da liberdade comercial, vier a surgir entre as
Potências signatárias da presente Ata ou Potências que, a seguir, a ela aderirem, essas Potencias se comprometem, antes do apelo às armas, a recorrer à mediação de uma ou de várias Potências amigas. No mesmo caso, as mesmas Potências se reservam o recurso facultativo ao procedimento da arbitragem.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Dia de Reis – Ultima celebração do nascimento de Jesus


Dia de Reis – Celebração do nascimento de Jesus

Último ano em que é celebrado o nascimento de Jesus pelos católicos nesta data, 6 de Janeiro de 353. O nascimento passará a ser comemorado no ano seguinte no solstício de Dezembro (25 de Dezembro). Os ortodoxos continuam a comemorar nesta data. O Imperador romano Constantino procurou resgatar a unidade religiosa do povo que governava. Constantino aproveitou a difusão do cristianismo para controlar o império. Foi ele que estabeleceu os costumes e rituais da Igreja Católica Romana, criada no Concílio de Nicéia em 325.

O Dia de Reis é celebrado anualmente a 6 de Janeiro. Esta celebração católica está associada à tradição natalícia, que diz que três reis magos do Oriente, visitaram o Menino Jesus na noite de 5 para 6 de Janeiro, depois de serem guiados por uma estrela.
A tradição manda que neste dia a família se volte a reunir para celebrar o fim dos festejos de Natal. É também o dia em que se cantam as Janeiras. O cântico das Janeiras começa no dia após o Natal e prolonga-se até ao Dia de Reis.

Segundo a tradição, os Reis Magos eram três: Gaspar, cujo nome significa “Aquele que vai inspecionar”; Melchior, que quer dizer: “Meu Rei é luz”; e Baltasar, que se traduz por: “Deus manifesta o Rei”.
Os Reis Magos só são mencionados em apenas um dos quatro evangelhos, o de Mateus. Nos 12 versículos em que trata do assunto, Mateus não especifica o número deles. Sabe-se apenas que eram mais de um, porque a citação está no plural – e não há nenhuma menção de que eram reis.

Cerca de 800 anos depois do nascimento de Jesus, eles foram associados a regiões do mundo antigo: Melchior, rei da Pérsia; Gaspar, rei da Índia; e Baltazar, rei da Arábia. Em hebreu, esses nomes significavam “rei da luz” (melichior), “o branco” (gathaspa) e “senhor dos tesouros” (bithisarea).
De qualquer forma, a tradição permaneceu viva e foi apenas no século III que eles receberam o título de reis – provavelmente como uma maneira de confirmar a profecia contida no Salmo 72: “Todos os reis hão de adorá-lo”.

O facto relevante é que a palavra mago deriva do latim magus e do grego mágos e significa sábio e sacerdote da Persia. Os Mágoi, ou Magos, faziam parte de uma casta sacerdotal detentora de todas as ciências, inclusive as ocultas. Dedicavam-se ao estudo da Astrologia e Astronomia. Tratavam-se de sacerdotes da religião zoroástrica e teriam ligação com Balaão, contemporâneo de Moisés (Números 24:17).
Tudo indica que os Magos eram astrólogos, já que seguiam estrelas e faziam cálculos para saber dia e local onde ocorreria o nascimento de Jesus, marcando o advento e o início de uma Nova Era: a Era de Peixes. A Estrela de Belém, tão mencionada nas escrituras, pode ter sido um alinhamento planetário entre Júpiter, Saturno e Marte, representando simbolicamente os três povos conhecidos: o branco (Júpiter) representado por Melchior, o negro (Saturno), representado por Baltazar, e o amarelo, asiático (Marte), Gaspar.

Esse alinhamento deve ter acontecido no signo de Peixes, no mesmo período em que tinha início a Era de Peixes, a era Cristã, marcada pelo nascimento de Jesus e pelo posicionamento do Equinócio a 0º da constelação de Peixes. Esse fenômeno celeste aconteceu por volta do ano 6 a.C., já que se sabe que o nascimento de Jesus pode ter ocorrido de 6 a 7 anos antes do início do nosso calendário, que passou por várias reformas e ajustes.
A Astrologia nesse período tinha um papel muito importante no médio oriente, por isso seria natural associar um evento celeste ao nascimento de Jesus, assim como se associou um eclipse à morte de Herodes e um cometa ao assassinato de Júlio César em 44 a.C. Estrelas em movimento ou cadentes pressagiavam a morte de grandes homens ou nascimento de deuses, como Agni, Buda e Cristo.

Foi Johannes Kepler, Astrólogo, astrônomo e matemático que, em 17 de Dezembro de 1603, na cidade de Praga, fez as primeiras associações astronômicas à Estrela de Belém. Ele estava a observar no seu telescópio a conjunção de Júpiter e Saturno na constelação de Peixes. Essa conjunção fazia com que os dois planetas somassem os seus brilhos e se parecessem com uma nova estrela, muito brilhante. Sendo um homem estudioso e postulante a pastor, Kepler lembrou-se do que havia lido num texto do Rabino Abravanel (1437-1508): os Astrólogos judeus diziam que quando Saturno fizesse conjunção com Júpiter em Peixes o Messias viria. Isto porque sabiam, e os Magos também, que a constelação de Peixes era conhecida como Casa de Israel, era o signo do Messias e sinal do fim dos tempos. Júpiter era a estrela real da casa de Davi e do príncipe do mundo e Saturno, a estrela protetora de Israel, da Palestina no oriente. Assim, eles compreenderam, por meio dos significados astrológicos da constelação e dos planetas envolvidos, que o Senhor do final dos tempos havia nascido.
Essa conjunção durou cinco meses durante o ano 7 a.C. – provável ano efetivo de nascimento de Jesus – de 29 de Maio a 08 de Junho, de 26 de Setembro a 6 de Outubro e de 05 a 15 de Dezembro e pôde ser vista com grande nitidez e claridade na região do Mediterrâneo. Kepler julgou ter encontrado a Estrela de Belém, coisa então não confirmada.

Foi apenas em 1925 que esse tema voltou a ser estudado. O estudioso alemão Paul Schnabel encontrou registos dessa conjunção em tabuinhas de argila datadas da antiga Babilônia e do período neo-babilônico. Essas pequenas tábuas estão em escrita cuneiforme e são registos astrológicos da antiga Escola de Astrologia de Sippar (Zimbir em sumério, Sippar em assírio-babilônio), atual sítio arqueológico de duas antigas cidades da baixa Mesopotâmia, separadas por apenas sete quilômetros na Babilônia, atual Iraque. Escavações realizadas no final do séc. XIX encontraram ainda os restos de um templo e um zigurate dedicado a Shamash – deus solar, e Ebabbar – o antigo escriba da Escola de Astrologia. Atualmente, essas tabuinhas encontram-se no Museu de Berlim, Alemanha.
Chegando ao local onde estava o menino Jesus, meses depois de seu nascimento, os magos abriram os cofres que transportavam e entregaram grande quantidade de presentes aos pais, Maria e José. Em seguida, cada um deles entregou uma moeda de ouro como presente para Jesus. O primeiro mago ofereceu-lhe ouro, o segundo incenso e o terceiro, mirra, para reafirmar a natureza nobre, a realeza de Jesus. Desde o início dos tempos o ouro é um dos artigos mais valiosos para a humanidade. O incenso aromático era o símbolo da função sacerdotal que Jesus viria a desempenhar e a mirra simbolizava o alívio das dores que Ele sofreria na sua crucificação. No ritual da Antiguidade, ouro era o presente para um rei. Incenso, para um religioso e Mirra, para um profeta. A mirra era usada para embalsamar corpos e, simbolicamente, representava a imortalidade.

Quem hoje visitar a Catedral de Colônia, na Alemanha, será informado de que ali repousam os restos dos 3 Reis Magos. De acordo com uma tradição medieval, os magos teriam se reencontrado quase 50 anos depois do primeiro Natal, em Sewa, uma cidade da Turquia, onde viriam a falecer. Mais tarde, seus corpos teriam sido levados para Milão, na Itália, onde permaneceram até o século 12, quando o imperador germânico Frederico dominou a cidade e trasladou as urnas mortuárias para Colônia.
De qualquer modo os Reis buscavam nas estrelas um caminho para o novo tempo, uma nova era de esperança e fé.


segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Queda de Granada - Dois de Janeiro de 1492


A dois de Janeiro de 1492 — Queda de Granada: A conquista de Granada marcou o fim da Reconquista, em que os Reis Católicos recuperaram todas as terras que os mouros ocupavam na Península Ibérica desde o ano de 711.
A chamada reconquista cristã, que teve no nosso primeiro Rei o seu mais conhecido protagonista, foi um processo que teve lugar pouco depois da invasão islâmica de 711, que num espaço de meses ocupa a quase totalidade do território da península (à excepção de uma pequena parcela montanhosa nas Astúrias) e que apenas teve o seu epílogo em 1492 com a queda de Granada.

O ponto de partida deste processo moroso costuma situar-se na Batalha de Covadonga, onde Pelágio I, designado líder da facção de Visigodos que se refugia nas Astúrias, à frente de um pequeno contingente consegue vencer os islâmicos numa batalha.
Não deixa de ser curioso que a invasão islâmica se tenha processado em meses, e que a reconquista tenha demorado quase 800 anos. Para termos uma ordem de grandeza, 800 anos é praticamente a idade de Portugal, que é o país mais antigo da Europa! A que se deve esta lentidão?

A resposta não é directa, mas os factores estão bem identificados. A própria invasão foi motivada por uma discordància entre o Rei Agila e o chamado “usurpador” Rei Rodrigo, último Rei visigótico da península. O Rei Agila, sendo destronado, pediu auxílio às tribos berberes do Norte de África, que por uma questão de simplificação costumamos designar por árabes, mas que seriam na sua maioria constituída por berberes. O líder da invasão foi Tariq Ziad, que efectuou a invasão por Gibraltar (nome em sua homenagem Gebal Tarik, i.e. Porto de Tarik, que deu Gibraltar) e que depois de derrotar o Rei Rodrigo na batalha de Guadalete, progrediu rapidamente para Norte. A existência de um foco de resistência nas Astúrias nunca foi motivo de grande preocupação, pelo que foi tolerado.
A rápida progressão islâmica para norte, aparentemente sem resistência, deve-se à complacência das povoações autóctones. Por um lado, estes nativos, descendentes das civilizações castrejas, não estavam autorizados pelos senhores Visigodos a possuir armas. Estes receavam uma revolta, pelo que apenas eles possuíam armas. Como eram em pequeno número, foram facilmente batidos em retirada pela chusma islâmica proveniente do norte de África.

Por outro lado, apesar de hoje estar envolto de algum romantismo o processo de reconquista-glorificando os feitos dos descendentes dos visigodos que foram conquistando palmos de terra para a cristandade - o que se verificou foi precisamente o contrário. A conquista islâmica foi antes uma libertação, muito mais do que propriamente uma submissão. Os conquistadores eram muito mais tolerantes do que os Visigodos. Tanto cristãos como judeus sefarditas puderam manter a sua religião e os seus costumes, tendo apenas que pagar um imposto. Evidentemente, ao longo destes oito séculos houve momentos em que essa tolerância foi maior e noutros em que foi muito menor, não esquecendo que também existiram perseguições, principalmente aos judeus.
A reconquista cristã beneficiou muito da divisão, a partir do século XI, do antigo califado em pequenos reinos, vulgarmente designados por taifas. Estas divisões nem sempre foram marcadas pela animosidade. Era comum estabelecerem-se alianças entre os cristãos e as taifas mouras, que se traduziam no pagamento de um tributo pelos príncipes berberes em troca de tréguas. Este regime de alianças vigorou até tarde. Quando o nosso rei D. Afonso III (1248-1279) conquistou as últimas praças algarvias teve que negociar com Afonso X, o Sábio, que era aliado do príncipe berbere. A situação resolveu-se com o casamento do Rei de Portugal com uma filha sua, mãe do Rei D. Dinis, tendo esta aliança a particularidade de configurar um caso de bigamia, porque o Rei era casado com a Condessa de Bolonha, que ainda era viva.

Este regime de tréguas apenas foi com a divisão do Império de Fernando Magno na figura dos seus 3 filhos, Garcia, Sancho e Afonso, que viria a culminar com a hegemonia deste último, pai da Condessa Dona Teresa, coroado imperador das Hispânia como Afonso VI (1047-1109).
Foi com o Imperador que a reconquista assumiu um caracter mais vigoroso, não sendo alheio ao contributo que obteve de nobres estrangeiros, que o auxiliaram nas batalhas com as taifas islâmicas. Foi o caso de Dom Raimundo, que casou com a sua filha (legítima) Dona Urraca, e a quem deu o condado da Galiza, e Dom Henrique, que casou com Dona Teresa, outra filha sua (esta nascida fora do matrimónio), mãe de Dom Afonso Henriques, a quem doou o Condado Portucalense.

Esta política acabou por não  surtir o efeito desejado, não fossem as suas pretensões hegemónicas esbarrar com os desejos autonomistas de famílias poderosas que não se queriam pôr debaixo do manto imperial. Este fenómeno foi particularmente intenso na região entre Douro e Minho, autêntico berço da independência portuguesa, que viria a escolher como seu líder um príncipe, neto do imperador, mas já nascido num ambiente fortemente marcado pelo desejo de independência.
Esse percurso foi difícil. Ao problema militar (conquista de território) somou-se a questão do reconhecimento da autonomia face a Leão e Castela, naquilo que foi uma tarefa ciclópica mas concretizada ao longo do reinado do fundador da nacionalidade.

A reconquista na península apenas termina com a queda de Granada em 1492, testa-de-ponte da fé islâmica na península, que se aguentou durante tantos séculos pela facilidade de abastecimento que dispunha através de Gibraltar, á vista do continente africano.
A reconquista cristã não foi, nem nunca será, completa. Ficou a herança cultural, muito mais forte do que por vezes supomos.

Assim a 2 de Janeiro de 1492 caí o ultimo reduto muçulmano na Península Ibérica, o reino de Granada.
A cidade espanhola de Granada, pertencente à Região Autónoma da Andaluzia, formou-se em torno de uma fortaleza construída pelos Árabes. No centro da cidade encontra-se a Catedral de Santa Maria da Encarnação (1523-1703), onde estão sepultados os Reis Católicos.

Explorada por Fenícios, Cartagineses e Gregos, dominada por Romanos e Visigodos, assolada por Vândalos e Alanos, a região de Granada, como quase toda a Península Ibérica, foi ocupada em 711 pelos muçulmanos comandados por Tariq, acontecimento este de real importância para a sua definição histórica e territorial. Dominada por Córdova, emirado e depois califado, Garnatha Alyejud (designação árabe da cidade perto da actual Granada, a Iliberis dos Romanos ou a Elvira dos Visigodos) conheceu um grande desenvolvimento no século VIII, sendo uma das mais importantes cidades do Al Andalus. Com a desagregação do califado de Córdova em 1031 em vários reinos taifa (designação jurídica árabe), devido à fitna (guerra civil), num deles se transformou Granada, governada entre 1010 e 1090 pela dinastia berbere dos Ziríadas (povo do Norte de África, que obriga os habitantes de Garnatha a fugir para Elvira), suprimida no último ano pela dos Almorávidas, substituídos em 1156 pelos Almóadas. Em 1231, chegaram os nazerís, de Ibn Nasr, cujo título real era Muhammad I, que se mantiveram em Granada até ao século XV. A partir desta dinastia, o reino passou a designar-se por Granada.
Em 1247, aquele rei árabe apoiou os castelhanos na tomada de Sevilha, o que gerou descontentamentos generalizados no reino, principalmente depois de os cristãos transformarem a mesquita em catedral. Os ataques de Castela, apesar da ajuda granadina em Sevilha, sucederam-se contra o reino nazerí, que apoiava revoltas mouriscas em Castela. Entre múltiplas tréguas, alianças e cedências de praças de parte a parte, Granada, para sobreviver como reduto muçulmano peninsular, teve que procurar até ao século XV um equilíbrio de forças com Castela e mesmo com os muçulmanos do Norte de África, ambos com políticas expansionistas sobre este território. Para além desta diplomacia, ora política ora guerreira, o reino de Granada teve que enfrentar revoltas internas ocasionais, e serviu de acolhimento aos muçulmanos que fugiam de todas as regiões peninsulares face ao avanço da Reconquista, principalmente da Andaluzia ocidental e do Levante (Valência, Múrcia), onde se sucediam pressões militares de Aragão, com quem se firmaram pactos também. Neste clima de instabilidade quase permanente e de esforço de guerra, a riqueza e a grandeza da civilização nazerí de Granada não perderam brilho, esmaltando o reino, nomeadamente a capital, de belas joias arquitectónicas ainda existentes, com o apoio e interesse constantes da corte. É o caso do conjunto monumental da Alhambra (do árabe, Al Hamra, a vermelha), começado a edificar no século XIII, bem como do Generalife, do século XIV, casa de campo e descanso dos reis de Granada. Deste século são também os poetas e eruditos Ibn Alcatib e Ibn Zamrak, cujos versos estão gravados nas paredes dos palácios da Alhambra. Por aquela altura brilharam ainda outras figuras da filosofia, das artes e da medicina, entre outras ciências, e até uma célebre universidade medieval - La Madraza. O desenvolvimento de técnicas agrícolas, com introdução de novas culturas e com os regadios, cimenta a exponência civilizacional a que chegou este reino, o que despertou cobiças e apressou a Reconquista.

Em 1309, Castela tomou Gibraltar, mantendo-se árabe, porém, Algeciras. Estes dois pontos eram estratégicos (passagem para África) para o reino de Granada, que daí se estendia até Almería, a leste, onde se continuavam a dar frequentes ataques aragoneses, ainda que sem resultados. No primeiro quartel do século XIV, os castelhanos chegaram às portas de Granada, sendo porém rechaçados para fora do reino, entretanto reorganizado em termos de defesa. Em 1333, Granada reconquistou Gibraltar, apoiada por genoveses e dinastias norte-africanas, conhecendo porém em 1340 a derrota na Batalha do Salado perante forças combinadas luso-castelhanas, o que deitou por terra o desejo de reconquista muçulmana da Península. Ao longo do século XIV, a Alhambra continuou a construir-se; a Reconquista deteve-se por vezes; mas o século XV, com a pressão demográfica e a expansão económica de Castela, seria a centúria da derrocada do reino de Granada. Para além de lutas internas (conspirações, rebeliões, guerra civil em 1427) e de falta de apoios do mundo árabe, Granada, apesar de conseguir suster alguns avanços de Castela e obter algumas tréguas, não conseguiu reestruturar-se internamente e começou a ceder aos ataques cristãos. Ainda desencadeou um contra-ataque entre 1433 e 1440, recuperando praças de Castela, mas a partir daqui, a história de Granada foi de defesa contra Castela, bloqueios económicos, tréguas e devolução de cativos, até ao golpe final dos Reis Católicos, em 2 de Janeiro de 1492, quando a conquistaram ao rei Boabdil. Este, diz a lenda, terá chorado e morrido de desgosto e nostalgia por abandonar a joia da civilização árabe da Península Ibérica. No século XVI, apesar do embelezamento e da valorização cultural da cidade e da região pelos espanhóis, ainda havia, na minoria mourisca, sentimentos saudosistas do antigo reino nazerí, como nos levantamentos nas Alpujarras, último foco de resistência árabe.





sábado, 24 de dezembro de 2016

A “quase” verdadeira história do Natal - celebrar o solstício de inverno


No dia 24 de Dezembro, há mais de 2000 anos, José e Maria iam a caminho de Belém para o censo, tal como havia ordenado César Augusto. José ia caminhando, e Maria, a ponto de dar à luz ao seu filho, ia sentada num burrinho. Meses antes, o arcanjo Miguel, ou Gabriel, havia visitado Maria para lhe dar a notícia que do seu ventre nasceria o filho de Deus, um menino que se chamaria Jesus.
Quando chegaram a Belém, Maria e José buscaram um lugar para se acomodarem, mas por terem chegado tarde todas as instalações estavam cheias. Finalmente, um bom senhor emprestou seu estábulo para passarem a noite ali.

José juntou um pouco de palha e fez uma cama para a sua esposa. O que ninguém poderia imaginar era que antes do dia terminar, Jesus nasceria ali mesmo.
Ao cair à noite, no céu nasceu uma estrela que iluminava mais que todas as outra e ficou justamente em cima onde estava o menino que acabara de nascer.

Muito longe dali, no Oriente, três sábios astrólogos chamados Melchior, Gaspar e Baltasar, sabiam que essa estrela significava que um novo rei estava para nascer.
Os três sábios, que hoje conhecemos como os três reis magos, foram seguindo a estrela brilhante até a manjedoura de Belém para visitar Jesus.

Quando chegaram ao seu destino, Melchior, Gaspar e Baltasar, procuraram a manjedoura e presentearam a criança com ouro, incenso e mirra.
É assim a narração feita pela Bíblia. Mas terá sido assim mesmo que tudo aconteceu? Terá Jesus “nascido” no dia 25 de Dezembro?

É verdade que o natal se tornou numa festa cristã que se comemora a 25 de dezembro e é considerada uma das maiores e mais importantes festas de todo o mundo. Comemora o nascimento do menino Jesus Cristo.
Mas qual a origem da palavra natal? A palavra natal vem do latim nãtãlis que é uma palavra derivada do verbo nãscor que significa nascer.

É preciso realçar que a humanidade comemora essa data desde bem antes do nascimento de Jesus - o Natal é tão antigo quanto a civilização.

Roma, século 2, dia 25 de Dezembro. A população está em festa, em homenagem ao nascimento daquele que veio para trazer benevolência, sabedoria e solidariedade aos homens. Cultos religiosos celebram o ícone, nessa que é a data mais sagrada do ano. Enquanto isso, as famílias apreciam os presentes trocados dias antes e se recuperam de uma longa comilança.
Mas não. Essa comemoração não é o Natal. Trata-se de uma homenagem à data de “nascimento” do deus persa Mitra, que representa a luz e, ao longo do século 2, tornou-se uma das divindades mais respeitadas entre os romanos. Qualquer semelhança com o feriado cristão, no entanto, não é mera coincidência.

A história do Natal começa, na verdade, pelo menos 7 mil anos antes do nascimento de Jesus. É tão antiga quanto a civilização e tem um motivo bem prático: celebrar o solstício de inverno, a noite mais longa do ano no hemisfério norte, que acontece no final de Dezembro. Dessa madrugada em diante, o sol fica cada vez mais tempo no céu, até o auge do verão. É o ponto de viragem das trevas para luz: o “renascimento” do Sol. Num tempo em que o homem deixava de ser um caçador errante e começava a dominar a agricultura, a volta dos dias mais longos significava a certeza de colheitas no ano seguinte. E então era só festa. Na Mesopotâmia, a celebração durava 12 dias. Já os gregos aproveitavam o solstício para homenagear Dionísio, o deus do vinho e da vida mansa, enquanto os egípcios relembravam a passagem do deus Osíris para o mundo dos mortos. Na China, as homenagens eram (e ainda são) para o símbolo do yin-yang, que representa a harmonia da natureza. Até povos antigos da Grã-Bretanha, mais primitivos que os seus contemporâneos do Oriente, comemoravam: o forrobodó era em volta de Stonehenge, monumento que começou a ser erguido em 3100 a.C. para marcar a trajetória do Sol ao longo do ano.
A comemoração em Roma, então, era só mais um reflexo de tudo isso. Cultuar Mitra, o deus da luz, no 25 de Dezembro era nada mais do que festejar o velho solstício de inverno – pelo calendário atual, diferente daquele dos romanos, o fenômeno na verdade acontece no dia 20 ou 21, dependendo do ano. Seja como for, o culto a Mitra chegou à Europa lá pelo século 4 a.C., quando Alexandre, o Grande, conquistou o Médio Oriente. Centenas de anos depois, soldados romanos tornaram-se devotos da divindade. E ela foi parar no centro do Império.

Mitra, então, ganhou uma celebração exclusiva: o Festival do Sol Invicto. Esse evento passou a dar origem a outra festa dedicada ao solstício. Era a Saturnália, que durava uma semana e servia para homenagear Saturno, senhor da agricultura. “O ponto inicial dessa comemoração eram os sacrifícios ao deus. Enquanto isso, dentro das casas, todos se felicitavam, comiam e trocavam presentes”, dizem os historiadores Mary Beard e John North no livro Religions of Rome (“Religiões de Roma”, sem tradução para o português). Os mais animados entregavam-se a orgias – mas isso faziam os romanos o tempo todo.
Enquanto isso, uma religião monoteísta que não ligava a estas comemorações crescia em Roma: o cristianismo.

Solstício cristão
As datas religiosas mais importantes para os primeiros seguidores de Jesus só tinham a ver com o seu martírio: a Sexta-Feira Santa (crucificação) e a Páscoa (ressurreição). O costume, afinal, era lembrar apenas a morte de personagens importantes. Líderes da Igreja achavam que não fazia sentido comemorar o nascimento de um santo ou de um mártir – já que ele só se torna uma coisa ou outra depois de morrer. Isto para não reconhecer que ninguém fazia ideia da data exacta em que Jesus teria vindo ao mundo – o Novo Testamento não diz nada a esse respeito. Só que existia um problema: os fiéis de Roma queriam encontrar que fizesse frente às comemorações pelo solstício.

E encontrar uma celebração cristã nessa época viria a calhar – principalmente para os chefes da Igreja, que teriam mais facilidade em amealhar novos fiéis. Assim, em 221 d.C., o historiador cristão Sextus Julius Africanus teve a ideia: faze coincidir o aniversário de Jesus no dia 25 de Dezembro, com o nascimento de Mitra. A Igreja aceitou a proposta e, a partir do século 4, quando o cristianismo se tornou a religião oficial do Império, o Festival do Sol Invicto começou a mudar de homenageado. “Associado ao deus-sol, Jesus assumiu a forma da luz que traria a salvação para a humanidade”, diz o historiador Pedro Paulo Funari. Assim, a invenção católica herdava tradições anteriores. “Ao contrário do que se pensa, os cristãos nem sempre destruíam as outras percepções de mundo como rolos compressores. Nesse caso, o que ocorreu foi uma troca cultural”, afirma outro historiador especialista em Antiguidade, André Chevitarese, da UFRJ.
Não existem evidências que nos permitam dizer como eram os primeiros Natais cristãos, mas é facto que hábitos como a troca de presentes e as refeições suntuosas permaneceram. E a coisa não parou por aí. Ao longo da Idade Média, enquanto missionários espalhavam o cristianismo pela Europa, costumes de outros povos foram entrando para a tradição natalina. A que deixou um legado mais forte foi o Yule, a festa que os nórdicos faziam em homenagem ao solstício. O presunto da ceia, a decoração colorida das casas e a árvore de Natal vêm de lá. Só isso.

Outra contribuição do norte foi a ideia de um ser sobrenatural que dá presentes para as criancinhas durante o Yule. Em algumas tradições escandinavas, era (e ainda é) um gnomo quem cumpre esse papel. Mas essa figura logo ganharia traços mais humanos.
E assim nasce o Pai Natal

Ásia Menor, século 4. Três raparigas da cidade de Myra (onde hoje fica a Turquia) viviam muito mal. Seu pai não possuía quaisquer bens, e as raparigas só viam uma maneira de sair da miséria: entrar para o ramo da prostituição. Foi então que, numa noite de inverno, um homem misterioso jogou um saquinho cheio de ouro pela janela (alguns dizem que foi pela chaminé) e desapareceu. Na noite seguinte, atirou outro; depois, mais outro. Um para cada rapariga. Aí as raparigas usaram o ouro como dotes de casamento – não era possível nessa época arranjar um bom marido sem pagar por isso. E viveram felizes para sempre, sem o fantasma de entrar para a vida, digamos, “profissional”. Tudo graças ao sujeito dos saquinhos. O seu nome? Papai Noel.
Bom, mais ou menos. O tal benfeitor era um homem de carne e osso conhecido como Nicolau de Myra, o bispo da cidade. Não existem registros históricos sobre a sua vida, mas lenda é o que não falta. Nicolau seria um ricaço que passou a vida dando presentes para os pobres. Histórias sobre a generosidade do bispo, como essa das raparigas que escaparam do bordel, ganharam estatuto de mito. Rapidamente lhe foram atribuídos toda sorte de milagres. E um século após a sua morte, o bispo foi canonizado pela Igreja Católica. Tornou-se são Nicolau.

Um santo multiuso: padroeiro das crianças, dos mercadores e dos marinheiros, que levaram a sua fama de bonzinho para todos os cantos do Velho Continente. Na Rússia e na Grécia Nicolau tornou-se o santo mais importante, a sua Nossa Senhora de Fátima. No resto da Europa, a imagem benevolente do bispo de Myra fundiu-se com as tradições do Natal. Tornou-se o santo presenteiro oficial da data. Na Grã-Bretanha, passaram a chamá-lo de Father Christmas (Papai Natal). Os franceses cunharam Pére Nöel. Na Holanda, o santo Nicolau teve o nome encurtado para Sinterklaas. E o povo dos Países Baixos levou essa versão para a colônia holandesa de Nova Amsterdã (atual Nova York) no século 17. Assim o Natal que nos conhecemos ia ganhando o mundo, mas nem todos gostaram da ideia.
Natal fora-da-lei

Inglaterra, década de 1640. No meio de uma sangrenta guerra civil, o rei Charles I digladiava os cristãos puritanos – os filhos mais radicais da Reforma Protestante, que dividiu o cristianismo em várias facções no século 16.
Os puritanos queriam quebrar todos os laços que outras igrejas protestantes, como a anglicana, dos nobres ingleses, ainda mantinham com o catolicismo. A ideia de comemorar o Natal era um desses laços. Então era preciso terminar com ela.

Primeiro, eles tentaram mudar o nome da data de “Christmas” (Christ’s mass, ou Missa de Cristo) para Christide (Tempo de Cristo) – já que “missa” é um termo católico. Não satisfeitos, decidiram extinguir o Natal: em 1645, o Parlamento, de maioria puritana, proibiu as comemorações pelo nascimento de Cristo. A justificáo seria que, além de não estar mencionada na Bíblia, a festa ainda dava início a 12 dias de gula, preguiça e mais um monte de outros pecados.
A população não aderiu e continuou a comemorar às escondidas. Em 1649, Charles I foi executado e o líder do exército puritano Oliver Cromwell assumiu o poder. As intrigas sobre a comemoração continuaram, e chegaram a pancadaria e repressões violentas. A situação, no entanto, durou pouco. Em 1658 Cromwell morreu e a restauração da monarquia trouxe a festa de volta. Mas o Natal não estava completamente a salvo. Alguns puritanos do outro lado do oceano logo proibiriam a comemoração nas suas terras. Foi na então colônia inglesa de Boston, onde festejar o 25 de Dezembro se tornou prática ilegal entre 1659 e 1681. O lugar que se tornaria os EUA, afinal, tinha sido colonizado por puritanos ainda mais linha-dura que os seguidores de Cromwell. Tanto que o Natal só se tornou feriado nacional em 1870, quando uma nova realidade já falava mais alto que cismas religiosas.

Com o desenvolvimento da Revolução Industrial torna-se óbvia a produção em massa. Com ela surge a indústria dos presentes, faz nascer a publicidade natalícia e acaba por transformar o bispo Nicolau no agente de propaganda mais requisitado do planeta. Até meados do século 19, a sua imagem mais comum era a de um bispo mesmo, com manto vermelho e mitra – aquele chapéu comprido que as autoridades católicas usam.
Para se enquadrar nos novos tempos, então, foi necessário alterar a sua imagem. O cirurgião foi o publicitário americano chamado Thomas Nast, que em 1862, tirou as referências religiosas, adicionou uns quilinhos a mais, remodelou o figurino vermelho e estabeleceu a residência dele no Pólo Norte – para que o “velhinho” não pertencesse a país nenhum. Nascia o Pai Natal de hoje. Mas a figura do bom velhinho só espalharia por todo o mundo depois de 1931, quando se tornou estrela de uma série de anúncios da Coca-Cola. A campanha foi sucesso imediato. Tão grande que, nas décadas seguintes, o gorducho se tornou a coisa mais associada ao Natal. Mais até que o verdadeiro homenageado da comemoração. Ele mesmo: o Sol.

Após esta tentativa de narrar a história do Natal, tenho a certeza que cada um continuará a acreditar no seu próprio “Natal”. Façam isso. O mais importante é que o Natal seja quando um homem quiser, onde se quiser e que traga a todos os povos do mundo, Paz, prosperidade, Solidariedade, Igualdade e Fraternidade.