segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Queda de Granada - Dois de Janeiro de 1492


A dois de Janeiro de 1492 — Queda de Granada: A conquista de Granada marcou o fim da Reconquista, em que os Reis Católicos recuperaram todas as terras que os mouros ocupavam na Península Ibérica desde o ano de 711.
A chamada reconquista cristã, que teve no nosso primeiro Rei o seu mais conhecido protagonista, foi um processo que teve lugar pouco depois da invasão islâmica de 711, que num espaço de meses ocupa a quase totalidade do território da península (à excepção de uma pequena parcela montanhosa nas Astúrias) e que apenas teve o seu epílogo em 1492 com a queda de Granada.

O ponto de partida deste processo moroso costuma situar-se na Batalha de Covadonga, onde Pelágio I, designado líder da facção de Visigodos que se refugia nas Astúrias, à frente de um pequeno contingente consegue vencer os islâmicos numa batalha.
Não deixa de ser curioso que a invasão islâmica se tenha processado em meses, e que a reconquista tenha demorado quase 800 anos. Para termos uma ordem de grandeza, 800 anos é praticamente a idade de Portugal, que é o país mais antigo da Europa! A que se deve esta lentidão?

A resposta não é directa, mas os factores estão bem identificados. A própria invasão foi motivada por uma discordància entre o Rei Agila e o chamado “usurpador” Rei Rodrigo, último Rei visigótico da península. O Rei Agila, sendo destronado, pediu auxílio às tribos berberes do Norte de África, que por uma questão de simplificação costumamos designar por árabes, mas que seriam na sua maioria constituída por berberes. O líder da invasão foi Tariq Ziad, que efectuou a invasão por Gibraltar (nome em sua homenagem Gebal Tarik, i.e. Porto de Tarik, que deu Gibraltar) e que depois de derrotar o Rei Rodrigo na batalha de Guadalete, progrediu rapidamente para Norte. A existência de um foco de resistência nas Astúrias nunca foi motivo de grande preocupação, pelo que foi tolerado.
A rápida progressão islâmica para norte, aparentemente sem resistência, deve-se à complacência das povoações autóctones. Por um lado, estes nativos, descendentes das civilizações castrejas, não estavam autorizados pelos senhores Visigodos a possuir armas. Estes receavam uma revolta, pelo que apenas eles possuíam armas. Como eram em pequeno número, foram facilmente batidos em retirada pela chusma islâmica proveniente do norte de África.

Por outro lado, apesar de hoje estar envolto de algum romantismo o processo de reconquista-glorificando os feitos dos descendentes dos visigodos que foram conquistando palmos de terra para a cristandade - o que se verificou foi precisamente o contrário. A conquista islâmica foi antes uma libertação, muito mais do que propriamente uma submissão. Os conquistadores eram muito mais tolerantes do que os Visigodos. Tanto cristãos como judeus sefarditas puderam manter a sua religião e os seus costumes, tendo apenas que pagar um imposto. Evidentemente, ao longo destes oito séculos houve momentos em que essa tolerância foi maior e noutros em que foi muito menor, não esquecendo que também existiram perseguições, principalmente aos judeus.
A reconquista cristã beneficiou muito da divisão, a partir do século XI, do antigo califado em pequenos reinos, vulgarmente designados por taifas. Estas divisões nem sempre foram marcadas pela animosidade. Era comum estabelecerem-se alianças entre os cristãos e as taifas mouras, que se traduziam no pagamento de um tributo pelos príncipes berberes em troca de tréguas. Este regime de alianças vigorou até tarde. Quando o nosso rei D. Afonso III (1248-1279) conquistou as últimas praças algarvias teve que negociar com Afonso X, o Sábio, que era aliado do príncipe berbere. A situação resolveu-se com o casamento do Rei de Portugal com uma filha sua, mãe do Rei D. Dinis, tendo esta aliança a particularidade de configurar um caso de bigamia, porque o Rei era casado com a Condessa de Bolonha, que ainda era viva.

Este regime de tréguas apenas foi com a divisão do Império de Fernando Magno na figura dos seus 3 filhos, Garcia, Sancho e Afonso, que viria a culminar com a hegemonia deste último, pai da Condessa Dona Teresa, coroado imperador das Hispânia como Afonso VI (1047-1109).
Foi com o Imperador que a reconquista assumiu um caracter mais vigoroso, não sendo alheio ao contributo que obteve de nobres estrangeiros, que o auxiliaram nas batalhas com as taifas islâmicas. Foi o caso de Dom Raimundo, que casou com a sua filha (legítima) Dona Urraca, e a quem deu o condado da Galiza, e Dom Henrique, que casou com Dona Teresa, outra filha sua (esta nascida fora do matrimónio), mãe de Dom Afonso Henriques, a quem doou o Condado Portucalense.

Esta política acabou por não  surtir o efeito desejado, não fossem as suas pretensões hegemónicas esbarrar com os desejos autonomistas de famílias poderosas que não se queriam pôr debaixo do manto imperial. Este fenómeno foi particularmente intenso na região entre Douro e Minho, autêntico berço da independência portuguesa, que viria a escolher como seu líder um príncipe, neto do imperador, mas já nascido num ambiente fortemente marcado pelo desejo de independência.
Esse percurso foi difícil. Ao problema militar (conquista de território) somou-se a questão do reconhecimento da autonomia face a Leão e Castela, naquilo que foi uma tarefa ciclópica mas concretizada ao longo do reinado do fundador da nacionalidade.

A reconquista na península apenas termina com a queda de Granada em 1492, testa-de-ponte da fé islâmica na península, que se aguentou durante tantos séculos pela facilidade de abastecimento que dispunha através de Gibraltar, á vista do continente africano.
A reconquista cristã não foi, nem nunca será, completa. Ficou a herança cultural, muito mais forte do que por vezes supomos.

Assim a 2 de Janeiro de 1492 caí o ultimo reduto muçulmano na Península Ibérica, o reino de Granada.
A cidade espanhola de Granada, pertencente à Região Autónoma da Andaluzia, formou-se em torno de uma fortaleza construída pelos Árabes. No centro da cidade encontra-se a Catedral de Santa Maria da Encarnação (1523-1703), onde estão sepultados os Reis Católicos.

Explorada por Fenícios, Cartagineses e Gregos, dominada por Romanos e Visigodos, assolada por Vândalos e Alanos, a região de Granada, como quase toda a Península Ibérica, foi ocupada em 711 pelos muçulmanos comandados por Tariq, acontecimento este de real importância para a sua definição histórica e territorial. Dominada por Córdova, emirado e depois califado, Garnatha Alyejud (designação árabe da cidade perto da actual Granada, a Iliberis dos Romanos ou a Elvira dos Visigodos) conheceu um grande desenvolvimento no século VIII, sendo uma das mais importantes cidades do Al Andalus. Com a desagregação do califado de Córdova em 1031 em vários reinos taifa (designação jurídica árabe), devido à fitna (guerra civil), num deles se transformou Granada, governada entre 1010 e 1090 pela dinastia berbere dos Ziríadas (povo do Norte de África, que obriga os habitantes de Garnatha a fugir para Elvira), suprimida no último ano pela dos Almorávidas, substituídos em 1156 pelos Almóadas. Em 1231, chegaram os nazerís, de Ibn Nasr, cujo título real era Muhammad I, que se mantiveram em Granada até ao século XV. A partir desta dinastia, o reino passou a designar-se por Granada.
Em 1247, aquele rei árabe apoiou os castelhanos na tomada de Sevilha, o que gerou descontentamentos generalizados no reino, principalmente depois de os cristãos transformarem a mesquita em catedral. Os ataques de Castela, apesar da ajuda granadina em Sevilha, sucederam-se contra o reino nazerí, que apoiava revoltas mouriscas em Castela. Entre múltiplas tréguas, alianças e cedências de praças de parte a parte, Granada, para sobreviver como reduto muçulmano peninsular, teve que procurar até ao século XV um equilíbrio de forças com Castela e mesmo com os muçulmanos do Norte de África, ambos com políticas expansionistas sobre este território. Para além desta diplomacia, ora política ora guerreira, o reino de Granada teve que enfrentar revoltas internas ocasionais, e serviu de acolhimento aos muçulmanos que fugiam de todas as regiões peninsulares face ao avanço da Reconquista, principalmente da Andaluzia ocidental e do Levante (Valência, Múrcia), onde se sucediam pressões militares de Aragão, com quem se firmaram pactos também. Neste clima de instabilidade quase permanente e de esforço de guerra, a riqueza e a grandeza da civilização nazerí de Granada não perderam brilho, esmaltando o reino, nomeadamente a capital, de belas joias arquitectónicas ainda existentes, com o apoio e interesse constantes da corte. É o caso do conjunto monumental da Alhambra (do árabe, Al Hamra, a vermelha), começado a edificar no século XIII, bem como do Generalife, do século XIV, casa de campo e descanso dos reis de Granada. Deste século são também os poetas e eruditos Ibn Alcatib e Ibn Zamrak, cujos versos estão gravados nas paredes dos palácios da Alhambra. Por aquela altura brilharam ainda outras figuras da filosofia, das artes e da medicina, entre outras ciências, e até uma célebre universidade medieval - La Madraza. O desenvolvimento de técnicas agrícolas, com introdução de novas culturas e com os regadios, cimenta a exponência civilizacional a que chegou este reino, o que despertou cobiças e apressou a Reconquista.

Em 1309, Castela tomou Gibraltar, mantendo-se árabe, porém, Algeciras. Estes dois pontos eram estratégicos (passagem para África) para o reino de Granada, que daí se estendia até Almería, a leste, onde se continuavam a dar frequentes ataques aragoneses, ainda que sem resultados. No primeiro quartel do século XIV, os castelhanos chegaram às portas de Granada, sendo porém rechaçados para fora do reino, entretanto reorganizado em termos de defesa. Em 1333, Granada reconquistou Gibraltar, apoiada por genoveses e dinastias norte-africanas, conhecendo porém em 1340 a derrota na Batalha do Salado perante forças combinadas luso-castelhanas, o que deitou por terra o desejo de reconquista muçulmana da Península. Ao longo do século XIV, a Alhambra continuou a construir-se; a Reconquista deteve-se por vezes; mas o século XV, com a pressão demográfica e a expansão económica de Castela, seria a centúria da derrocada do reino de Granada. Para além de lutas internas (conspirações, rebeliões, guerra civil em 1427) e de falta de apoios do mundo árabe, Granada, apesar de conseguir suster alguns avanços de Castela e obter algumas tréguas, não conseguiu reestruturar-se internamente e começou a ceder aos ataques cristãos. Ainda desencadeou um contra-ataque entre 1433 e 1440, recuperando praças de Castela, mas a partir daqui, a história de Granada foi de defesa contra Castela, bloqueios económicos, tréguas e devolução de cativos, até ao golpe final dos Reis Católicos, em 2 de Janeiro de 1492, quando a conquistaram ao rei Boabdil. Este, diz a lenda, terá chorado e morrido de desgosto e nostalgia por abandonar a joia da civilização árabe da Península Ibérica. No século XVI, apesar do embelezamento e da valorização cultural da cidade e da região pelos espanhóis, ainda havia, na minoria mourisca, sentimentos saudosistas do antigo reino nazerí, como nos levantamentos nas Alpujarras, último foco de resistência árabe.





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