sábado, 29 de outubro de 2016

Batalha do Salado -  30 de Outubro de 1340


A Batalha do Salado foi travada a 30 de outubro de 1340, entre Cristãos e Mouros, junto da ribeira do Salado, na província de Cádis (sul de Espanha), pela defesa da Península Ibérica da invasão dos mouros.
Abul-Hassan, rei de Fez e de Marrocos, aliado ao emir de Granada, decidira reapossar-se a qualquer preço dos domínios cristãos, tendo as forças muçulmanas já entrado em acção contra Castela. A frota do prior de S. João do Hospital[i], almirante castelhano, que tentara opor-se ao desembarque dos mouros, foi completamente destroçada por uma tempestade, e esse desastre obrigou Afonso XI de Castela a humilhar-se, mandando pedir à esposa, Dona Maria - a quem tanto desrespeitara com os seus escandalosos casos amorosos com Leonor de Gusmão - que interviesse junto de seu pai, o rei português Afonso IV de Portugal (1325-1357), para que este enviasse uma esquadra de socorro.

Dona Maria, recolhida num convento em Sevilha e, apesar dos agravos que sofrera, acedeu ao pedido. Todavia, Afonso IV, no intuito de humilhar ainda mais o genro, respondeu ao apelo dizendo, verbalmente, ao enviado da filha, que se o rei de Castela precisava de socorro o pedisse directamente. Vergando o seu orgulho ao peso das circunstâncias, Afonso XI de Castela repetiu pessoalmente - por carta - o pedido foi feito, e o soberano português enviou-lhe imediatamente uma frota comandada pelo almirante genovês Manuel Pessanha (ou Pezagno) e por seu filho Carlos. Mas era cada vez mais desesperada a situação de Afonso XI, a quem o papa censurava asperamente.
Além da frota portuguesa, Castela recebeu um reforço de doze galés cedidas pelo rei de Aragão, Dom Pedro IV (1336-1387) mas tudo isto nada era em comparação com o avassalador número dos contingentes mouros. O rei de Granada, Yusef-Abul-Hagiag, ocupou em Setembro de 1340, o comando das tropas, às quais pouco depois se juntou, em Algeciras, um formidável exército sob as ordens de Abul-Hassan. A ameaça muçulmana era apavorante. Os mouros, embora repelidos nas primeiras tentativas de ataque a Tarifa, na província de Cádis, não deixavam prever a possibilidade de vantagens futuras para as hostes cristãs.
Reconhecendo a premente necessidade da ajuda efectiva do rei de Portugal, Afonso XI de novo solicitou a intervenção de D. Maria. Esta acedeu uma vez mais e foi-se encontrar com seu pai, Dom Afonso IV, em Évora. O soberano português atendeu as súplicas de sua filha, e logo esta foi dar a boa notícia a seu marido, que ansioso, a fora esperar a Juromenha.

Dom Afonso IV reuniu então em Elvas junto com D. Martim Peres de Soveral, o maior número possível de cavaleiros e peões, e à frente do exército, que ia aumentando durante o caminho com os contingentes formados em vários pontos, dirigiu-se a Castela, onde por ordens do genro foi recebido com todas as honras. Em Sevilha, o próprio Afonso XI acolheu festivamente o rei de Portugal e sua filha, a rainha Dona Maria. Ali se desfizeram quanto menos momentaneamente, os ressentimentos de passadas discórdias.
Acordado entre os dois monarcas o plano estratégico, não se demoraram em sair de Sevilha a caminho de Tarifa, tendo chegado oito dias depois a Pena del Ciervo avistava-se o extensíssimo arraial muçulmano.

Em 29 de Outubro, reunido o conselho de guerra, foi decidido que Afonso XI de Castela combateria o rei de Marrocos, e Afonso IV de Portugal enfrentaria o de Granada. Afonso XI designou D. João Manuel para a vanguarda das hostes castelhanas, onde iam também D. João Nunes de Lara e o novo mestre de Sant'Iago, irmão de Leonor de Gusmão. Com D. Afonso IV viam-se o arcebispo de Braga Gonçalo Pereira, o prior do Crato, Álvaro Gonçalves Pereira (Pai de Nuno Álvares Pereira), o mestre da Ordem de Avis (Dom Martim Martins de Avelar?) e muitos denotados cavaleiros.
No campo dos cristãos e dos muçulmanos tudo se dispunha para a batalha, que devia travar-se ao amanhecer do dia seguinte. A cavalaria castelhana, atravessando o Salado, iniciou a peleja. Logo saiu, a fazer-lhe frente, o escol da cavalaria muçulmana, não conseguindo deter o ataque. Quase em seguida avançou Afonso XI, com o grosso das suas tropas, defrontando então as inumeráveis forças dos mouros. Estava travada, naquele sector, a ferocíssima luta. O rei de Castela, cuja bravura não comportava hesitações, acudia aos pontos onde o perigo era maior, carregando furiosamente sobre os bandos árabes até os pôr em debandada.

Após forte peleja não tardou muito que, numa fuga desordenada, africanos e granadinos abandonassem a batalha, largando tudo para salvar a vida. O campo estava juncado de corpos de mouros, vítimas da espantosa mortandade.
O arraial, enorme, dos reis de Fez e de Granada, com todos os seus despojos valiosíssimos em armas e bagagens, caiu finalmente em poder dos cristãos, que ali encontraram ouro e prata em abundância, constituindo tesouros de valor incalculável. Ao fazer-se a partilha destes despojos, assim como dos prisioneiros, quis Afonso XI agradecer ao sogro, pedindo-lhe que escolhesse quanto lhe agradasse, tanto em quantidade como em qualidade.

Afonso IV, porém num dos raros gestos de desinteresse que praticou em toda a sua vida, só depois de muito instado pelo genro escolheu, como recordação, uma cimitarra cravejada de pedras preciosas e, entre os prisioneiros, um sobrinho do rei Abul-Hassan. A 1 de Novembro ao princípio da tarde, os exércitos vencedores abandonaram finalmente o campo de batalha, dirigindo-se para Sevilha onde o rei de Portugal pouco tempo se demorou, regressando logo a casa.
Pode imaginar-se sem custo a impressão desmoralizadora que a vitória dos cristãos, na Batalha do Salado, causou em todo o mundo muçulmano, e o entusiasmo que se espalhou entre o cristianismo europeu. Era ao cabo de seis séculos, uma renovação da vitória de Carlos Martel em Poitiers.

Afonso XI para exteriorizar o seu regozijo, apressou-se a enviar ao Papa Bento XII uma pomposa embaixada portadora de valiosíssimos presentes, constituídos por uma parte das riquezas tomadas aos mouros, vinte e quatro prisioneiros portadores de bandeiras que haviam caído em poder dos vencedores, muitos cavalos árabes ricamente ajaezados e com magníficas espadas e adagas pendentes dos arções, e ainda o soberbo corcel em que o rei castelhano pelejara.
Quanto ao auxílio prestado por Portugal, que sem dúvida fora bastante importante para decidir a vitória dos exércitos cristãos, deixou-o o Papa Bento XII excluído dos louvores que, em resposta, endereçou a Afonso XI em consequência da opulenta «lembrança» enviada pelo rei de Castela. Dom Afonso IV, que durante o seu reinado praticou as maiores crueldades, ficaria na História com o cognome de «o Bravo», em consequência da sua acção na Batalha do Salado.


[i] Fundada em Jerusalém, a Ordem de São João do Hospital conheceu, ao longo dos séculos, mercê da sorte das armas na luta entre a Fé de Cristo e a Fé de Maomé, vários locais onde instalou a sua Casa-Mãe. Primeiro Jerusalém, depois Margat, S. João de Acre (1206-1290), Chipre (1290-1309), Rodes (1309-1310), onde adquiriu uma feição “insular”, no dizer de Fr. Lucas de Santa Catharina, e se manteve até 1522, quando a ilha foi tomada pelos turcos. Finalmente, instituíram-se na ilha de Malta.
            Esta é, em síntese, a origem da Ordem dos Hospitalários, ou de São João de Jerusalém, de Rodes ou ainda designada de Malta, a partir de 1530, quando os freires, como referimos, se instalaram na ilha assim chamada, que lhes foi doada pelo Imperador Carlos V.




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