A 27 de Novembro de 1807 — A
família real portuguesa embarca dando início à sua fuga para o Brasil na
sequência da invasão do país por tropas napoleónicas.
Estando iminente a invasão
francesa, preparou-se com a maior urgência a retirada da Família Real
portuguesa para a sua maior colónia de então, o Brasil. A 22 de Outubro de 1807
era assinada uma convenção secreta entre o nosso Príncipe Regente D. João
e o rei inglês Jorge III. Esta convenção estabelecia a transferência da sede da
monarquia portuguesa para o Brasil. Estava ainda prevista a ocupação da ilha da
Madeira pelas tropas inglesas, assim como o compromisso de fazermos um tratado
de comércio com a Inglaterra, logo após o Governo português se instalar no
Brasil.
A 27 de Outubro de 1807, diversos
representantes franceses e espanhóis assinaram o tratado de Fontainebleau[i],
onde ficou estabelecido que o território português seria dividido entre a
França e a Espanha.
Sem terem conhecimento deste tratado
franco-espanhol, os nossos representantes em Paris e Madrid foram expulsos,
pois Napoleão já havia decidido invadir Portugal em virtude de D. João não
cumprir as cláusulas do ultimatum. Enquanto Junot marchava com as suas tropas
em direcção a Lisboa, chegava ao rio Tejo uma armada inglesa sob o comando do
almirante Sydney Smith com a missão de escoltar a Família Real portuguesa para
o Brasil. O embarque deu-se a 27 de Novembro de 1807, mas os navios só zarparam
no dia 29, em virtude de uma tempestade no mar.
No dia 30 de Novembro de
1807, Junot chegou a Lisboa com parte do seu exército, limitando-se a ver ao
longe, no horizonte, os últimos navios da Armada portuguesa e inglesa que
levavam para outras terras “a nossa soberania”. Tinha começado a I Invasão
Francesa, das três que Napoleão havia de arquitectar para tentar ocupar o
território português.
Após ter assinado a Convenção
secreta de 1807 com Jorge III de Inglaterra, o Príncipe Regente Dom João
decide-se pela transferência da sede da monarquia portuguesa para o Brasil.
Naquela Convenção, assinada a 22 de Outubro em Londres, ratificada em Portugal
a 8 de Novembro e pela Grã-Bretanha a 19 de Dezembro de 1807, também se decidia
a condição das tropas de Sua Majestade na Ilha da Madeira.
Acredita-se que Dom João não tivesse
conhecimento da existência do Tratado de Fontainebleau e do seu conteúdo, pelo
qual a Família Real portuguesa deixava de reinar em Portugal e previa o
desmembramento do reino.
Dom João acabaria por saber, in
extremis, as intenções de Napoleão. O imperador, contando com o rápido avanço
de Junot e ignorando que este se visse forçado a atrasar a sua chegada a Lisboa,
ordenou que se publicasse no jornal francês Moniteur, de 11 de Novembro, o
famoso decreto de 27 de Outubro pelo qual a Casa Real Portuguesa deixaria de
reinar, imaginando que apenas seria conhecido em Portugal, depois da entrada do
seu exército em Lisboa.
“Aquele decreto, porém,
chegou rapidamente ao conhecimento do governo britânico. O ministro de Portugal
em Londres, D. Domingos de Sousa Coutinho, receando que as suas comunicações
atingissem o seu destino tardiamente, já depois da entrada em Lisboa das tropas
francesas, expediu um correio extraordinário com um exemplar do Le Moniteur para
o Príncipe Regente.
Ao ter conhecimento deste facto o
governo inglês deu instruções a Sir Sidney Smith, que se encontrava com a sua
esquadra na entrada do Tejo, para escoltar a Família Real, no caso de esta pretender
abandonar Lisboa. Por um feliz acaso o correio demorou na sua viagem apenas
quatro dias o que permitiu salvar o Príncipe e a sua Família da sorte que os
esperava.”
Esta sucessão dos acontecimentos,
permitiu a Dom João encetar vários esforços determinando que “partiriam todos
os membros da família real, os ministros de Estado e os empregados do Paço, sem
excepção; decidiu também que a sede do governo do Paço, se estabeleceria
provisoriamente no Rio de Janeiro, ficando o território português sujeito a uma
regência de cinco fidalgos, que nomeou, a qual governaria em seu nome com os
poderes que costumavam conceder ás regências os antigos reis de Portugal quando
iam pelejar na Africa.”
Esta decisão foi, contudo, bem-sucedida
na sua execução, uma vez que o grande objectivo de evitar o encontro da Família
Real com Junot foi conseguido. No entanto, este foi recebido amistosamente por
ordem do Príncipe Regente. “Apenas foi conhecida em Lisboa a entrada das tropas
francesas em território nacional, o Conselheiro de Estado, D. José de Noronha,
Marquês de Angeja, sugeriu ao Príncipe a necessidade de mandar alguém ao
encontro de Junot, a fim de se saber da boca do general as suas intenções.
O conselho foi aceite, não
demorando o Príncipe a dar-lhe execução recaindo a escolha em José de Oliveira
Barreto, negociante na praça de Lisboa, com estabelecimento na Calçada da
Estrela, possivelmente da intimidade do General, durante a sua embaixada junto
do Príncipe Regente.
Simultaneamente, foi
encarregado pelo Governo o coronel Carlos Frederico Lecor, um dos oficiais mais
distintos do exército português, de observar as posições e movimentos das
divisões de Junot.”
Segundo José Acúrsio das Neves, a
esquadra portuguesa era composta de oito naus, três fragatas, três brigues, uma
escuna e o seu comandante-em-chefe era o Vice-Almirante. Este número de navios
não é unânime para todos os autores onde o assunto é debatido, conforme iremos
ver na tabela30 que se segue:
A Família Real dividia-se pelas
diversas naus que constituíam a esquadra, o Príncipe Regente seguiu na Príncipe
Real, D. Carlota Joaquina, juntamente com as suas filhas e D. Miguel, com
apenas 5 anos, embarcaram na Rainha de Portugal, as irmãs da Rainha seguiram na
nau Príncipe do Brasil.
Como é defendido por vários
autores, embarcaram nos navios disponíveis cerca de 15 000 pessoas,
representando todas as classes, “Os fidalgos, os ministros, os conselheiros, e
tantos outros [...]: alguns regimentos de linha acompanharam.” Rumavam
agora para a maior e mais rica colónia portuguesa - O Brasil. Por ironia do
destino, as riquezas, nomeadamente o ouro, que tinham vindo do Brasil para
financiar as grandes construções nacionais, como o Monumento de Mafra, Aqueduto
das Águas Livres, etc..., eram como que devolvidos à colónia, pois as classes
mais abastadas faziam-se acompanhar dos seus bens, ouro, prata, pedras
preciosas, obras de arte, livros, tudo embarcava. “[...] em mais de 80 milhões
de cruzados orçam alguns o dinheiro que partiu para o Brasil, ficando no régio erário
apenas 10.000 cruzados, sem que se houvessem pago os empregados e credores do
Estado.”
Se o embarque de tanta gente e a partida da
esquadra não foram pacíficas, a viagem também não se pode dizer que foi calma,
pois no dia 7 de Dezembro, uma tempestade dispersou a frota na rota do Rio de
Janeiro. Alguns dos navios foram “parar” à Baía a 22 de Janeiro de 1808.
Os relatos que nos chegam da
chegada da Família Real ao Rio de Janeiro transparecem o júbilo do povo e o
empenhamento das entidades locais, nomeadamente o empenho do último Vice-Rei do
Brasil, Dom Marcos de Noronha e Brito, oitavo conde dos Arcos, que se preparava
para entregar o poder “a governança” ao Seu Senhor. Antes de desembarcar no
Rio, D. João passou pela Baía.
[i]
Acordo
assinado em 1807, entre a França e a Espanha, e aprovado por Napoleão
Bonaparte, onde se estabelecia a divisão de Portugal no reino da Lusitânia
(Entre-Douro-e-Minho), destinado à rainha da Etrúria, e no reino dos Algarves
(Alentejo e Algarve), concedido a um ministro de Carlos IV. Uma convenção militar
da mesma data estabelecia a entrada em Espanha de 28 000 soldados
franceses com o objectido de seguirem até Lisboa. Este tratado não chegou a ser
executado nem divulgado. O objetivo de Napoleão era o de ocupar Espanha e
exercer represálias contra Portugal por este não ter aderido ao bloqueio
continental que pretendia fechar os portos europeus à Inglaterra. A recusa de
Portugal, tradicional aliado inglês, terá motivado a primeira invasão francesa.
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